O CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL:
(NOVA VERSÃO)
Os actos administrativos pré-contratuais são susceptíveis de impugnação
de duas formas: ou recorrendo à acção administrativa especial (a.a.e.) 46º/3
CPTA ou recorrendo ao processo urgente que o CPTA institui nos artigos 100º e
seguintes, este não é nada mais que o meio processual específico, através do
qual se deve proceder à impugnação de actos relativos à formação dos contratos
aí taxativamente previstos. Só se devendo recorrer à a.a.e. quando não seja
possível utilizar o processo urgente.
ÂMBITO:
O 36º/1/b) estabelece que o contencioso pré-contratual tem carácter
urgente. O número dois, estabelece que os processos urgentes correm em férias,
com dispensa de vistos prévios, mesmo em fase de recurso jurisdicional, e os
actos da secretaria são praticados no próprio dia com precedência sobre
quaisquer outros, tratando-se por isso de um processo especial de impugnação
instituído em razão da urgência na obtenção de uma decisão sobre o mérito da
causa, aplicando-se o regime da a.a.e sujeita aos requisitos dos 78ºss e com as
adaptações necessárias previstas no 102º CPTA.
O artigo 100º/1 inclui os actos relativos à formação dos seguintes
contratos:
. formação de contratos de empreitada
. prestação de serviços
. fornecimento de bens
. concessão de obras públicas
Aos procedimentos relativos à contratação de empreitadas, prestação de
serviços e de fornecimento nos sectores da água, da energia, dos transportes e
das telecomunicações regulados pela directiva nº93/38 CEE transposta para o
direito interno pelo DL-223/2001, alterado pelo DL-234/2004, também se aplica o
regime do contencioso pré-contratual do 100º-103º CPTA.
Segundo Prof. José Carlos Vieira de Andrade "não se percebe, porém,
porque é que esse meio (processo urgente regulador do contencioso
pré-contratual) só vale para contratos abrangidos pelas directivas
comunitárias, como se não fosse uma solução boa para a generalidade dos
contratos (...)", "Em defesa da opção legislativa poderá no entanto
dizer-se que é legítimo, em defesa da própria urgência, limitar as situações de
urgência, tanto mais que no âmbito das acções relativas ao procedimento de
formação dos restantes contratos se admite, embora com um único fundamento. A
decisão antecipada do fundo da causa no contexto do respectivo processo
cautelar."
OBJECTO:
O processo de contencioso pré-contratual urgente pode ter como objecto:
- Impugnação de actos
administrativos pré-contratuais (por exemplo: abertura de concurso; publicação
do anúncio; decisão de adjudicação; etc.) ou de actos equiparados praticados
por sujeitos privados 100º/1/3 CPTA
- Impugnação do contrato quando
celebrado na pendência do processo 102º/4 CPTA
De acordo com as seguintes directivas: 89/665/CEE e 92/13/CE, também
denominadas Directivas Recurso, a UE impõe aos Estados-Membros que estes
adoptem métodos que possibilite a tramitação mais rápida de alguns processos.
Nasceu então a exigência de criação de meios mais fugazes e eficazes para que a
tutela jurisdicional efectiva, presente no 20º e 268.º/4 CRP. As Directivas
Recursos, possibilitam o lesado a actuar de forma urgente contra todos os
actos administrativos que possam ferir de alguma forma o particular.
Abrange ainda os Contratos Públicos, uma vez que o legislador ao
transpôr as directivas para o direito interno administrativo português alargou
o âmbito do 100.º/1 e 2 do CPTA englobando actualmente os contratos de
concessão de obras públicas, e estendeu também a impugnação, aos documentos que
precedem o concurso público.
Deste modo no âmbito das Directivas Recurso as impugnações podem
dirigir-se não apenas à anulação das decisões ilegais, mas também à supressão
de especificações técnicas, económicas e financeiras discriminatórias incluídas
no anúncio e programa do concurso ou caderno de encargos, podendo também
originar a atribuição de indemnizações. Assim são susceptíveis de impugnação os
actos:
. Actos primários e secundários: como por exemplo um acto de anulação do
procedimento pré-contratual ou de revogação da adjudicação - Acórdão STA 14,
Dezembro, 2005 nº905/2005: no acto administrativo de anulação do procedimento
contratual existe uma conduta incompatível com a subsistência do acto de
adjudicação que revela, inequivocamente, a vontade de revogar este último acto.
. Actos de conteúdo positivo e negativo: para a tutela efectiva
jurisdicional, a existência do meio processual expedito, com vista a assegurar
o princípio da concorrência no âmbito dos contratos públicos, deve ser
aplicado, que para efeitos de impugnação de actos administrativos de conteúdo
positivo, quer para o efeito de reacção contra negativos, ou situações de
inércia administrativa, dirigidos à condenação à prática de actos devidos.
. Impugnação de normas emitidas pela entidade adjudicante: a disposição
do 100º/2 ao admitir expressamente a possibilidade de impugnação de qualquer
documento conformador do procedimento de formação dos contratos.
Deste modo, a garatia da via judicial para supressão de especificações
técnicas, económicas e financeiras discriminatórias incluídas nos documentos
contratuais permite aos particulares a impugnação directa das referidas normas
nos processos urgentes, viabilizando a declaração de ilegalidade com eficácia
geral das normas em causa, com base num pedido que pode ser apresentado sem
necessidade de verificação de recusa de aplicação em três casos concretos 73º/1
CPTA.
PRAZOS:
Do 46º/3 resulta que o meio processual urgente instituído no 100º e
seguintes CPTA é um meio processual necessário e não alternativo, a sua não
utilização dentro do prazo estabelecido no 101º impede a impugnação dos mesmo
actos nos termos previstos para a a.a.e. isto é, considera-se extinto o mesmo
direito.
Hoje, ao abrigo do CPTA 101º o prazo de caducidade é de 30 dias, o
acórdão do TCA do Sul de 7, Abril de 2005 nº655/05 decidiu que o prazo curto de
um mês tem carácter imperativo e é o único aplicável à impugnação dos actos
administrativos relativos à formação dos contratos previstos no 100ºCPTA, sendo
imposto pela eficácia e celeridade do respectivo contrato, possa estar
assegurada a sua estabilidade e legalidade da administração para o celebrar com
o adjudicatório escolhido.
No sentido de o meio processual urgente dos artigos 100º-103º ser de utilização
necessária e não uma alternativa à a.a.e., Vieira de Andrade, Mário Aroso de
Almeida, Maria João Estorninho que refere nos termos do artigo 100º, a
impugnação de actos relativos à formação dos contratos cabe a tramitação dos
processos urgentes como aliás dispõe neste sentido 46º/3CPTA excluindo assim do
âmbito da a.a.e. a impugnação de actos tendentes à formação de contratos.
Para Pedro Gonçalves este regime legal tem carácter imperativo, pela
articulação entre 46º/3 e 100º/1 CPTA, bem como toda a ratio do regime
pré-contratual conduzem necessariamente ao resultado de que a pretensão do
interessado em relação a actos administrativos, se encontra exclusivamente
coberta pelas regras do processo urgente. Assim, e sob pena de se atentar
contra toda a lógica que comandou a instituição de um processo urgente, a
utilização necessária nos casos aplicáveis deve manter-se.
O fim prioritário da instituição de um processo urgente de contencioso
pré-contratual reside sobretudo na satisfação de dois perfis relacionados o
interesse público, o interesse na estabilização rápida dos procedimentos
pré-contratuais e o interesse na estabilização rápida dos procedimentos
pré-contratuais e o interesse no início da execução dos contratos públicos, a
lei parte do princípio geral de que são a entidade demandada e os interesses
por ela prosseguidos, a reclamar uma "solução de urgência".
Assim, face aos argumentos expostos, isto é, tendo em conta os
interesses públicos inerentes aos contratos e face aos interesses dos co-contratantes,
bem como pela necessidade de uma rápida estabilização da situação jurídica, os
prazos mais morosos, sem carácter urgente, não salvaguardam esses mesmos
interesses, caso se opte por uma subsidariedade, permitindo a impugnação dos
actos de acordo com o procedimento da a.a.e.
O único desvio ao prazo vertido do 101º prende-se com a impugnação de
actos nulos, no entanto a doutrina e a jurisprudência diverge nesta questão, no
entanto a posição minoritária parece fazer mais sentido uma vez que um acto que
é nulo, não produz efeitos, e podendo a nulidade pode ser declarada a todo o
tempo estes actos são sempre impugnáveis. É esta a disciplina dos actos
administrativos em geral e naturalmente não deveria ser diferente com os actos
administrativos pré-contratuais. Nesta óptica não faria sentido restringir o
campo de aplicação do 101º a actos anuláveis até porque o legislador não o fez.
Esta posição é apoiada pelo Prof. Pedro Gonçalves.
Apenas uma breve nota relativa à matéria da cumulação de pedidos. Dada a
insusceptível resposta normativa expressa por via da remissão 100º/1 CPTA na
medida em que a remissão não abrange o 47º CPTA que permite a cumulação de
pedidos de anulação com pedidos de condenação, ou de reconstituição entre
outros, anteriormente esta era uma questão debatida, hoje, é aceite a cumulação
no regime pré contratual tanto pela doutrina como pela jurisprudência, assim
caberá desde logo ao autor no momento de optar, se deve ou não proceder à
cumulação de pedidos, avaliar se não estará a pôr em risco a celeridade e deste
modo a efectividade da tutela que à partida este tipo de processo lhe poderá
proporcionar.
CONCLUSÃO:
O direito à tutela jurisdicional efectiva e ao acesso ao direito é um
direito fundamental inerente a um Estado de Direito democrático, a efectividade
da tutela exige providências urgentes, mas providências que não pertencem ao
domínio da tutela cautelar, pois só podem ser proferidas num processo de fundo,
claramente dirigido a proporcionar uma tutela final, que se debruce sobre a
relação jurídico-administrativa, e com carácter de urgência dada a celeridade
com que se impõe alcançar a justa composição de interesses públicos e privados
envolvidos.
A garantia da via judicial para supressão das especificações técnicas,
económicas e financeiras discriminatórias incluídas nos documentos contratuais
é uma imposição da Directiva de Recursos 2º/1.
Assim, permitindo aos particulares a impugnação directa das referidas
normas nos processos urgentes, viabilizando a declaração de ilegalidade com
eficácia geral das normas em causa, com base num pedido que pode ser
apresentado sem necessidade de verificação de recusa de aplicação de três casos
concretos – 73º/1 CPTA.
Infere-se então que deste modo, face aos argumentos expostos, tendo em
conta os interesses públicos inerentes aos contratos e face aos interesses dos
co-contratantes, bem como pela necessidade de uma rápida estabilização da
situação jurídica, os prazos mais morosos, sem carácter urgente, não
salvaguardam esses mesmos interesses, caso se opte por uma subsidiariedade,
permitindo a impugnação dos actos administrativos respeitantes aos seus
procedimentos pela a.a.e. e não somente pelo processo urgente do contencioso
pré contratual 100º CPTA.
Existindo cumulação de pedidos haverá que ponderar se a cumulação é de
molde a justificar uma desaceleração do processo.
DICIONÁRIO: PRATA, Ana. Dicionário Jurídico, Almedina 1994
BIBLIOGRAFIA:
ANDRADE, José Carlos Vieira. A Justiça Administrativa, Almedina, 2006
GONÇALVES, Pedro. Avaliação do Regime Jurídico do Contencioso
pré-contratual urgente, cadernos de Justiça Administrativa, Março 2007
MARTINS, Ana Gouveia. A Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo,
Coimbra 2005
OLIVEIRA, Rodrigo Esteves. O Acto Administrativo Contratual – Cadernos
de Justiça Administrativa nº 63 Maio/Junho 20